Uma das categorias mais interessantes do direito obrigacional são os “contratos de colaboração”, cujos elementos centrais são a cooperação e a confiança na atuação conjunta de ambas as partes. Na talentosa definição de Victória Duarte, “tratam-se de contratos que dependem de esforços comuns para o seu sucesso, sendo a confiança, entra as partes um requisito essencial para a sua estabilidade” (Contratos Empresariais de Colaboração, p. 52. Londrina: Thoth, 2022).
Um dos contratos de colaboração mais importantes na vida econômica e social do Brasil é a franquia. Segundo dados da Associação Brasileira de Franchising, o faturamento no segundo trimestre deste ano alcançou R$ 48 bilhões.
Pela repercussão social, o tema atrai a atenção do direito. Um dos principais livros em nosso país sobre o tema, que serve de apoio aos advogados e demais operadores, é da professora Ana Claudia Redecker. Excelente obra, de fácil consulta, cuja leitura sempre recomendo. (Franchising: Curitiba: Appris Editora, 2020).
Na jurisprudência, colhem-se acórdãos interessantes do STJ que serão lembrados neste artigo.
Quanto à sua função, sublinha a ministra Nancy Andrighi, a franquia é uma “relação de fomento econômico, porquanto visa ao estímulo da atividade empresarial pelo franqueado” (REsp nº 1881149/DF, 3. T. DJe 10.06.2021).
A respeito de natureza jurídica, pondera a ministra que ele se qualifica como “típico, consensual, bilateral, oneroso, comutativo, de execução continuada e solene ou formal”. Embora seja formado através de contato de adesão, “a franquia não consubstancia relação de consumo. Cuida-se, em verdade, de relação de fomento econômico, porquanto visa ao estímulo da atividade empresarial pelo franqueado”. (REsp nº 1.881.149/DF, 3. T. DJe: 10.6.2021)
Dentre as questões processuais relevantes, surgem debates quanto à legalidade da cláusula compromissória. Tratando-se de contrato empresarial, ela é frequente. Contudo, pondera o STJ, que o contrato de franquia é de adesão. Logo, as cláusulas devem ser interpretadas com boa-fé.
Por ilustração, exige-se destaque em negrito à cláusula compromissória: “A 3ª Turma do STJ firmou entendimento no sentido de caber ao Poder Judiciário, nos casos em que é identificado um compromisso arbitral claramente ilegal, declarar a nulidade dessa cláusula. Destacou, ainda, que os contratos de franquia, mesmo não se tratando de relação de consumo, possuem a natureza de contrato de adesão. Por fim, consignou que deve ser conferida à cláusula compromissória integrante do pacto firmado entre as partes o devido destaque, em negrito, tal qual exige a norma em análise, com aposição de assinatura ou de visto específico para ela, sob pena de manifesta ilegalidade”. (AgInt nos EDcl no AREsp nº 1.560.937/SP, 3. T., Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze. DJe: 18.3.2022.)
Agrega o ministro Raul Araújo que “os contratos de adesão, mesmo aqueles que não apresentam relação de consumo, devem observar o que prescreve o art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/96, que dispõe que, nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula”. (AgInt no AREsp nº 1.809.792/SP, 4. T. Rel. Min. Raul Araújo. DJe: 18.2.2022.)
É frequente o debate acerca da presença e da violação à cláusula de exclusividade em favor da franqueada, presente quando o franqueador é omisso a respeito da fiscalização de terceiros, que perturbam o desempenham do franqueado (REsp nº 1.741.586/MG, 3. T., Rel. Min. Paulo Sanseverino. DJe: 13.6.2022)
Um caso interessante envolveu uma relação negocial na qual as partes não firmaram o contrato, a despeito de ter ocorrido a sua execução. Apreciando o caso, considerou o STJ que “a proibição à contraditoriedade desleal no exercício de direitos manifesta-se nas figuras da vedação ao comportamento contraditório (nemo potest venire contra factum proprium) e de que a ninguém é dado beneficiar-se da própria torpeza (nemo auditur propriam turpitudinem allegans). A conservação do negócio jurídico, nessa hipótese, significa dar primazia à confiança provocada na outra parte da relação contratual”.
Agregou que, no caso, “a franqueadora enviou à franqueada o instrumento contratual de franquia. Esta, embora não tenha assinado e restituído o documento àquela, colocou em prática os termos contratados, tendo recebido treinamento da recorrida, utilizado a sua marca e instalado as franquias. Inclusive, pagou à franqueadora as contraprestações estabelecidas no contrato. Assim, a alegação de nulidade por vício formal configura-se comportamento contraditório com a conduta praticada anteriormente. Por essa razão, a boa-fé tem força para impedir a invocação de nulidade do contrato de franquia por inobservância da forma prevista no art. 6º da Lei 8.955/94”. (REsp nº 1.881.149/DF, 3. T., Rel. Min. Nancy Andrighi. DJe: 10/6/2021)
No âmbito do direito do consumidor, considerou a Corte possível a responsabilização solidária do franqueador e do franqueado pela reparação de danos. Conforme voto do ministro Marco Bellizze, “cabe às franqueadoras a organização da cadeia de franqueados do serviço, atraindo para si a responsabilidade solidária pelos danos decorrentes da inadequação dos serviços prestados em razão da franquia”. (REsp nº 1.426.578/SP).
Contudo, há limites nessa responsabilidade solidária. O dano deve derivar da atividade típica do franqueado e do franqueador. Por exemplo, asseverou o ministro Raul Araújo que “inexiste responsabilidade solidária da franqueadora de serviços educacionais pelos danos materiais e morais decorrentes da morte de aluno em razão de acidente de trânsito, causado por culpa do motorista de ônibus escolar, pois o serviço de transporte escolar realizado por terceiro foi contratado exclusivamente pela franqueada, sendo serviço autônomo e alheio aos serviços prestados em razão da franquia de metodologia de ensino”. (AgInt no AREsp n. 1.456.249/SP, 4. T. DJe: 20.6.2022)
Esses e tantos outros casos demonstram o amadurecimento do contrato de franquia na vida negocial brasileira, bem como na pauta dos tribunais.
Por Daniel Ustarroz, professor de Direito Civil (PUCRS) e advogado (OAB/RS nº 51.548; e Marianna Passos, mestre em Direito (PUCRS), advogada (OAB/RS nº 103.063) Recentemente, na sessão virtual finalizada em 3 de junho, o STF concluiu julgamento histórico e afastou a incidência de Imposto de Renda sobre a pensão alimentícia. A ADI nº 5422 havia […]
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